Após presenciar mais uma cena de agressão do padrasto à mãe, o menino Carlos da Silva, aos cinco anos, fugiu de casa e se escondeu em um ônibus de um terminal rodoviário próximo de onde morava, em Juazeiro do Norte. Adormeceu, e quando acordou já estava em outra cidade, iniciando uma longa e desconhecida jornada.
Após mais de duas décadas, as perguntas sobre “de onde vim” e “cadê minha mãe” puderam ser respondidas na terça-feira (24), quando um panfleto intitulado “procuro minha mãe” chegou às pessoas certas.
O caminho de volta às origens só foi possível, primeiro, pela memória de Carlos. Embora tivesse apenas cinco anos, ele fixou quase 30 anos depois importantes momentos que davam pistas sobre de onde vinha: o passeio com a avó à estátua de Padre Cícero, o pequeno terminal rodoviário onde costumava brincar e pedir dinheiro, além de o ponto de partida para a jornada ao desconhecido: fugindo de casa, se escondeu à noite em um dos ônibus de transporte interurbano. Adormeceu, e quando acordou já estava em outra cidade.
Identificado pelo motorista, foi levado para casa de acolhimento de crianças órfãs em Fortaleza, no início dos anos 1990. Desde então, passou por vários abrigos e também viveu pelas ruas da capital cearense, até ser acolhido pela Associação Beneficente Pequeno Nazareno, que acolhe crianças e adolescentes em vulnerabilidade em Maranguape, município da Região Metropolitana de Fortaleza.
Quando lhe perguntavam sobre de onde vinha, sabia dizer que o nome da mãe era Geane, tinha duas irmãs e um irmão, que lembrava ser Diego. Reconhecia como seu nome próprio Antônio Carlos da Silva, e ainda tinha um tio artesão, chamado Nino, que lhe presenteava com carrinhos feitos de barro.
“Em sonho, já voltei muitas vezes pra casa”, disse Antônio Carlos. E quando dormia as lembranças ficavam ainda mais fortes.
“Vejo uma plataforma. Em cima, duas colunas de ferro que sustentavam um teto, talvez de alumínio. No meio da plataforma havia uma cabine de compra e venda de passagens de ônibus. Os motoristas aguardavam a vez deles para se dirigir até à plataforma e apanhar os primeiros passageiros. Lembro-me de pequenos pontos bem simples de venda de comes e bebes perto dessa plataforma. E o mais importante: Eu podia andar a pé dessa plataforma até a minha casa. Fiz esse trajeto muitas vezes”.
Antônio Carlos foi adotado pelo fundador da Associação Beneficente Pequeno Nazareno, o ex-frei alemão Bernardo Rosemeyer. Com apoio do pai adotivo e de de um amigo também chamado Carlos, passou a rabiscar os desenhos que trazia nas memórias de onde vinha, e os nomes que nunca esqueceu.
Aos 32 anos, o motorista, casado e com uma filha, não se sentia completo sem saber do paradeiro da família biológica. O caminho seria o Cariri cearense, a partir das lembranças da estátua de Padre Cícero.
Visitas: 728093